terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Admirável Mundo Novo

O Primeiro sutiã a gente nunca esquece. Nem o primeiro sutiã, nem a primeira calcinha. Nem o primeiro par de coxas. Ainda sinto o cheirinho de alfazema, que exalava daquele par de seios que me acolhia após uns tapas trocados na hora do recreio. Nas brigas com meus colegas, mesmo quando raramente eu ganhava, corria para aquele convés de felicidade. D. Francisquinha era a professora da 3ª Série primária, nossa primeira versão Bruna Lombardi: loirinha, baixinha e dois olhos verdes recheados de afeto. Com d. Francisquinha tomei gosto pela leitura. A leitura dos livros e da compaixão. Pois, como filho de uma mãe maravilhosamente desatenciosa, dela recebi carinho, estímulo e atenção.

Cheia de atenção e gestos delicados também era d. Carminha, professora da 4ª Série; uma espécie de Giovanna Antonneli: nariz afilado, cabelos pretos e curtos, óculos de aro, cinturinha de ampulheta e uma saia justa com uma fenda atrás. Ao se abaixar para apanhar o pedaço do giz que havia se quebrado, víamos o topo do Everest, uma parte do Pico da Neblina e uma pontinha do Aconcágua. Foi ali que nós tivemos uma visão do que realmente era a felicidade. Às vezes embalada na cor preta, branca ou rosa. Vermelha também. Mas, bege, não! Calcinha bege, não! As mulheres ainda não perceberam que a calcinha bege é um estorvo. A cor bege é a palidez dos sentidos, a vida sem sentimentos. Ok, a calcinha cor de rosa saiu de moda, mas bege?... Na mulher branca, some; na morena, é café com leite; na mulher negra parece um imenso emplastro Sabiá. Calcinha bege é legal para ir ao médico, comprar o pão... ou então é coisa de freira. Afirmo isso porque já morei numa república dirigida por três delas. Um horror! Numa pesquisa recente, a sem vida calcinha bege ocupou o terceiro lugar. O 1º ficou com a preta, o 2º com a branca e o 4º, com a vermelha. Esta última, para as mulheres que não sabem, é o símbolo da vulgaridade. Sorry!

Essa conversa sobre calcinha, na verdade, é para falar de d. Eliete, professora da 5ª Série; espécie de Sônia Braga, com 22 aninhos: às vezes, com um minivestido, outras vezes com uma minissaia. No quadro negro, era só ela levantar os braços e um par de belas coxas descia do seu vestido, deixando à mostra a divisa entre o que foi raspado e os pêlos que levariam à floresta da salvação. Certo dia, todos já saindo, d. Eliete pediu que eu ficasse. Disse que eu precisava melhorar a letra; portanto, ia ficar copiando qualquer coisa de um livro qualquer. Eu era da turma do fundão, voltei pra lá e comecei. Ficamos os dois. D. Eliete saiu de seu birô e veio corrigir as lições, ao meu lado. A nos separar, a fila das carteiras do meio. Nesse dia ela estava de minissaia. Sentou-se, mas virada para o meu lado. Se eu já escrevia ruim, a letra piorou. A ponta de uma calcinha estampada disparou uma tempestade de hormônios. Não quero causar inveja, mas assim foram vários dias. E posso afirmar: d. Eliete não usava calcinha bege. Na festinha de encerramento, no final do ano, fui me despedir dela. Eu, com a cabeça na altura do seu umbigo, e ela me perguntando: “Vai se lembrar de mim?”. Até hoje, d. Eliete!
“A felicidade está nos detalhes. As generalidades são apenas males necessários.”

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